Vulnerabilidade animal é também a nossa – o conceito de saúde única (One Health)
Ciências sociais

Vulnerabilidade animal é também a nossa – o conceito de saúde única (One Health)

A vulnerabilidade animal é também a nossa vulnerabilidade, diz artigo de pesquisadores da Universidade de São Paulo (USP). Os autores argumentam que “os maus-tratos infligidos aos animais nos estão adoecendo”.

Isso porque existe uma “inequívoca conexão entre saúde animal, saúde humana e saúde ambiental”. Essa relação é chamada de “One Health”, que quer dizer “Saúde Única”.

Tal conceito se refere à inseparável relação entre a saúde animal, humana e ambiental, que os humanos precisam compreender, aceitar e defender.

O artigo foi publicado na revista Lex Humana. Um dos autores é Roberto Augusto de Carvalho Campos, médico e professor da USP, que atua na área de medicina legal e também direito animal.

Saúde Única (One Health)

O conceito da Saúde Única, que é a tradução da versão original em inglês (One Health), representa a visão integrada entre a saúde humana, animal e ambiental. Isso porque vivemos todos no mesmo planeta e, portanto, não é possível isolar esses elementos que interagem de uma maneira ou de outra.

Os autores usam como exemplo as doenças de origem animal que podem ser transmitidas aos humanos – zoonoses. E alertam ainda para o “risco letal de outras zoonoses pandêmicas”.

Afinal, os riscos de transmissão dessas doenças em massa, de forma endêmica e pandêmica, aumentam com a globalização e também com as mudanças climáticas.

De fato, isso oferece aos microorganismos (como os vírus) “infinitas oportunidades de colonizar novos territórios e prosseguirem para a evolução em novas formas, algumas mais letais”, explicam os autores.

“Pode-se concluir, portanto, que a dita imprevisibilidade de uma pandemia, in casu, a COVID-19, não era tão imprevisível assim”, acrescentam.

“A Organização Mundial da Saúde alerta que, 75% das doenças infecciosas emergentes são doenças zoonóticas. Em recentes exemplos, têm-se: HIV, Ebola, Sars, Mers, Gripe Aviária e, COVID-19”.

De acordo com a publicação, calcula-se que, pelo menos, 80% dos agentes com potencial uso bioterrorista são patógenos zoonóticos.

“Existem atualmente mais de 200 tipos de zoonoses conhecidas. Algumas delas, já há muito bem familiares aos brasileiros: Dengue, Doença de Chagas, Esquistossomose, Febre Maculosa, Leishmaniose, Leptospirose, Malária etc.”

Antibióticos

Os autores alertam ainda para problema do uso de antibióticos em animais utilizados para alimentação. Lembram que essa prática comum realmente aumenta o potencial de desenvolvimento de microorganismos zoonóticos resistentes a medicamentos. Estes são capazes de se espalhar rapidamente em populações animais e, depois, humanas.

Eles explicam que o que torna indispensável o uso de antibióticos, bem como seu uso excessivo, é o fato de as instalações são lotadas e sujas. Com isso, permitem que as infecções se espalhem facilmente.

Além disso, usa-se esses medicamentos de forma profilática (preventiva) em animais saudáveis com o intuito de prevenir infecções ou promover o ganho de peso.

Essa prática !pode induzir o surgimento de bactérias resistentes, que não respondem mais ao tratamento com antibióticos”, eles alertam. “Este fenômeno representa um dos maiores perigos à saúde pública, dificultando o controle de zoonoses”.

Poluição e contaminação

Para os autores, o sistema de produção de alimentos de origem animal não é sustentável.

“Em verdade, traz problemas ambientais, inclusive para animais selvagens das proximidades e de saúde, também, para comunidades vizinhas. A densidade de suas instalações oferece maior potencial para poluição do ar, da água e da terra nas áreas próximas, perda de biodiversidade, erosão, desmatamento, emissão de gases que aumentam o efeito estufa etc.”

Os autores apontam ainda o descarte do estrume desses animais, cuja reprodução em massa é provocada pelos humanos. “O estrume animal, quando manejado incorretamente, representa uma ameaça à saúde humana e ao meio ambiente”.

“Os poluentes potenciais associados aos dejetos animais incluem nutrientes (amônia, nitrogênio etc.), matéria orgânica, patógenos, antibióticos, oligoelementos (arsênio e cobre) etc. que afetam diretamente a saúde humana”.

Diante desse cenário – cuja é complexidade é bem maior e é explorada no artigo, – em que os humanos, ao prejudicarem os animais, prejudicam a si mesmos, os autores argumentam que “a vulnerabilidade animal é também nossa vulnerabilidade”.

Eles advertem que “permanecendo neste errático comportamento, inclusive com mudanças climáticas cada vez mais acentuadas, estar-se-á caminhando para uma elevação do risco de doenças, sobretudo zoonoses pandêmicas, com repercussões inimagináveis. E, surpreendendo-se como se nada pudesse ser evitado”.


Referências bibliográficas:


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